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Foto do escritorJ. G. Bellett (1795-1864)

Os Patriarcas - José 2 - Parte 12/18

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ÍNDICE


 

Os Patriarcas

John Gifford Bellett

 

José

Parte 2


A ternura segue a fidelidade 

O povo do Faraó pode agora, depois de tudo isso, retornar e compartilhar a cena com eles. Podem agora ver nestes visitantes de Canaã, não os perseguidores de José, mas os seus irmãos. Eles são apresentados ao palácio apenas nesse caráter. Como na parábola do pródigo. O pai o verá em sua miséria; e, enquanto ainda está em farrapos, com fome e vergonha, beija-o e dá-lhe as boas-vindas; mas a família o verá como um filho à mesa. “Fazei sair daqui a todo varão”, foi a palavra de José, quando ele ia se dar a conhecer a eles; mas agora a casa de Faraó ouvirá que os irmãos de José chegaram. O espírito d’Aquele bendito de Quem aprendemos nos Evangelhos respira tudo isso. Estamos em João 4 e em Lucas 15 quando estamos em Gênesis 45.

 

Há ocasiões na história da vida humana que o coração reivindica tudo para si mesmo. O Senhor enfrentou isso, assim como todos nós às vezes enfrentamos. Houve fidelidade constante em Seu trato com os discípulos. Ele não deixava passar os erros deles. Ele os repreendia muito comumente, porque os amava de uma maneira muito perfeita e estava treinando a alma deles em vez de ser indulgente Consigo mesmo. Mas chegou um momento em que a fidelidade deve ceder o lugar e a ternura preenche-o. Quero dizer, a hora da separação, como vemos em João 14 – era tarde demais para ser fiel. A educação da alma sob as repreensões de um pastor não deveria continuar naquele momento. “Homens de pouca fé” ou “Como não entendeis ainda?” não seria ouvido então. Era a hora da despedida, e o coração teve permissão para assumir o controle total da situação.

 

Agora, o tempo de reconciliação, neste caso, é como a hora da separação. O coração o reivindica para si. Só a ternura convém agora; a fidelidade seria uma intrusa. E é assim que encontramos com José aqui. Ele chorou em voz alta, de modo que a casa do Faraó ouviu. Ele chorou no pescoço de todos os seus irmãos e os beijou, caiu no pescoço de seu irmão Benjamim e chorou e o beijou. E se ele falou em meio às lágrimas, foi apenas para encorajar seus corações e dar-lhes promessas e razões pelas quais deveriam ter plena confiança e tranquilidade diante dele. (Nem o Faraó, nem a casa do Faraó, nem ninguém no Egito parece ter sido informado do pecado dos irmãos).

 

Alcançando o coração 

Certamente posso reivindicar estes direitos e privilégios na hora da separação e na hora da reconciliação. E foi assim, como vemos, neste tempo da restauração de José aos seus irmãos. Mas quando tudo isso acabar, e ele os apresentar ao Faraó e ao palácio, e eles estiverem prontos para retornar a Canaã, em plena preparação para trazer seu velho pai ao Egito para José, quando eles estiverem em pé, Benjamim com eles, e Simeão com eles, e tudo era a exultação de uma hora favorecida e próspera, uma palavra de advertência não estaria fora de época, e José tem isso para eles: “Cuidais para que não vos desvieis pelo caminho” (KJV). “Simão, filho de Jonas, amas-Me?” foi dirigido ao coração de Pedro com o mesmo espírito, e em um momento semelhante, quando a reconciliação, como posso chamá-la, foi realizada, e a rede intacta de Pedro recolheu 153 peixes, e ele jantou com seu Mestre negado a beira-mar.

 

Certamente tudo isso, do início ao fim, é perfeito. Há uma magnificência moral na Escritura que a torna, de fato, a mais importante, como podemos dizer, das obras de Deus. O Espírito sopra toda ela. Sua ternura, sua grandeza e sua profundidade são iguais às d’Ele. Na questão da história de José e seus irmãos vemos algo que é muito excelente. Os erros e acertos de José, as reivindicações que ele fez e as injúrias que sofreu foram todos maravilhosamente respondidos. Quaisquer que fossem as dignidades que seus sonhos lhe haviam garantido, ele as conquistou plenamente.

 

Quaisquer que sejam as injustiças que ele tenha sofrido, todas foram vingadas da maneira que seu coração teria escolhido. O julgamento dos pecados deles contra si foi executado no seio dos próprios irmãos; nem uma palavra dura a respeito disso sai de seus lábios do início ao fim.

 

Estas foram as questões tanto dos acertos quanto dos erros de José. “Até isto procede do SENHOR dos Exércitos, porque é Maravilhoso em conselho e Grande em obra”.

 

Convicção produzida pelo Espírito 

Mas devo voltar a olhar para tudo isso por outro momento. A convicção da consciência pode ser apenas natural, o trabalho normal e necessário da alma, cuja ausência seria considerada evidência de um estado cauterizado ou endurecido. Mas quando é mais do que a mera agitação da alma sob a autoridade da natureza – quando o Espírito de Deus a produz – Ele usa Seu próprio objeto ou instrumento para trabalhar. Davi, sob o convincente Espírito, diz a Deus: “Contra Ti, contra Ti somente pequei, e fiz o que a Teus olhos é mal”. E assim será com Israel no dia de seu convencimento; pois a sua consciência estará então ligada ao outrora rejeitado e crucificado Jesus. Como o Senhor diz pelo profeta, derramarei sobre eles o espírito de graça e de súplicas; e olharão para Mim, a Quem traspassaram, e lamentarão por Ele, como quem chora por seu único filho, e será em amargura por Ele, como quem está em amargura por seu primogênito. Isto é convicção, quando o Espírito de Deus tira esse assunto das mãos da natureza e coloca-o nas Suas próprias mãos. Isto é a consciência fazendo o seu trabalho, como fala o apóstolo, “no Espírito Santo”. Num dia assim, sob tal autoridade e poder, Israel dirigir-se-á diretamente a Jesus. Isaías 53 nos mostra o mesmo de outra forma. E este é um trabalho precioso na alma – um trabalho necessário ainda em cada um de nós.

 

Agora isso é visto nos irmãos de José. Alguém já percebeu isso de uma forma geral. Mas é profundamente digno de nota. Foi do pecado deles contra José que eles se lembraram no dia de sua angústia. “Somos culpados acerca de nosso irmão”, dizem eles, “pois vimos a angústia da sua alma, quando nos rogava; nós porém não ouvimos”. Outros pecados poderiam estar presentes na consciência naquela época. Rúben poderia ter pensado na contaminação da cama de seu pai, Simeão e Levi em seu derramamento de sangue e traição, e Judá em seu casamento. Mas, estimulados à vida, não apenas pelos problemas que lhes sobrevieram, mas pelo Espírito, eles estão conscientes do pecado comum e falam, como se tivessem uma só consciência, de sua maldade em relação a José. E é isso que evidencia a obra do Espírito nesta convicção.

 

Esta é uma obra necessária, repito, em cada um de nós. Mas a fonte tem que fazer a sua obra assim como o Espírito de graça. José, como vimos, interpretou suas tristezas, embora nas mãos perversas, de maneira muito diferente daquela que seus medos e culpa as interpretaram. Eles disseram, e com muita razão, “somos culpados acerca de nosso irmão”; ele diz, e com muita verdade: “para conservação da vida, Deus me enviou diante da vossa face”. E este é o evangelho. Somos convencidos, mas salvos. Aprendemos que nos destruímos, mas que n’Ele está o nosso socorro. O sangue encontra a lança. A fonte se abre nas mesmas feridas que nossas próprias mãos infligiram. E esta será a experiência da eleição Judaica (cuja história destes irmãos prenuncia, como sabemos) nos dias de Isaías 53 e Zacarias 13. A cruz é a testemunha. A fé está diante dela, e ali aprende a ruína e a redenção.

 

Bênção completa 

No progresso desta história maravilhosa, a reconciliação, como vimos agora, é realizada. José recebeu seus irmãos; e tudo está, portanto, pronto para a plena bênção de Israel. A restauração deve seguir a conversão. Tempos de refrigério e restauração vêm sobre o arrependimento de Israel. O velho pai, com sua família e rebanhos, é trazido de Canaã, e com seus filhos apresentados ao Faraó, e eles estão colocados no melhor da terra, a terra de Gósen, em Ramessés.

 

Foi-lhes dito que poderiam deixar todos os seus pertences para trás, pois todo o bem da terra do Egito estava diante deles. E assim foi. Seus sacos vazios haviam descido primeiro ao Egito para serem cheios, e eles ainda precisavam provar que havia um coração e uma mão ali, ambos iguais e prontos para dar sem medida, e quanto mais vazios eles desciam, mais plenamente eles aprenderiam isso.

 

Eles eram apenas pastores, é verdade, e isso era uma abominação para os egípcios. Mas José “não se envergonha de lhes chamar irmãos”. Eram estrangeiros e pensionistas; mas o homem daquela época, o senhor do Egito, repito, “não se envergonha de lhes chamar irmãos”. Ele os reconhece na presença do rei, do palácio e da nação. E o rei prova ser da mesma opinião. O fato de serem irmãos de José foi suficiente para Faraó. Na verdade, isso fala muito aos nossos ouvidos. Está próximo o dia em que tudo isso será concretizado nos grandes originais de Cristo e Israel. Ele voltará para eles e dirá: “É Meu povo”, e eles dirão: “O Senhor é meu Deus”.

 

Uma possessão adquirida 

Mas embora isso seja ótimo e excelente, não é tudo. A própria Terra tem que ser estabelecida e abençoada, a herança tem que ser recebida e manifestada, assim como os irmãos, o Israel de Cristo, tiveram que ser assim vivificados e restaurados; e isso veremos agora. José, no capítulo 47, torna-se o mantenedor do mundo quanto à vida e ordem. Por ele a vida é preservada na Terra e a ordem mantida. E todas as pessoas serão dispostas naquele dia do seu poder. Tudo o que José faz está bem aos olhos de todo o povo. Seu dinheiro, seu gado, suas terras e eles próprios serão entregues ao Faraó; e ainda assim tudo lhes agrada, pois devem sua vida a José. O Egito, naqueles dias, era uma amostra do novo mundo, o mundo trazido de volta a Deus pela redenção. Foi uma “possessão adquirida [comprada – KJV], exatamente o que a Terra milenar será (Ef 1:14 - ACF). Foi a criação reconciliada, libertada da condenação, da fome, da morte e da maldição, pela mão de um salvador. O trigo de José comprou a terra, o gado e as pessoas. Tudo estava sob o comando do Faraó em um novo caráter, como uma possessão comprada, permanecendo na graça da redenção. Faraó, que foi rei do país, ainda é rei do país; mas ele tem outro, um redentor da terra e do povo, associado a ele agora, como antes não tinha. Como nos dias milenares. Que quadro a mão de Deus desenhou para nós aqui! Que promessa temos aqui, sim, que amostra da Terra nos dias do reino!

 

Maravilhosa profecia 

Faraó havia confiado em José, e José havia prometido a Faraó, nos primeiros dias, quando ainda nada havia sido feito. Antes que a palavra de José começasse a ser cumprida, Faraó o havia assentado com dignidade e poder, dando-lhe uma esposa dentre as filhas dos excelentes da terra, e colocando sobre ele um nome que já dizia a todos que o liam, o que ele pensava dele e como o recebeu. (Diz-se que Zafenate-Paneia, na antiga língua egípcia, significava “o salvador do mundo”; em hebraico, como entendemos, pode ser traduzido como “o revelador de segredos”). E José, na confiança que tudo estaria de acordo com as interpretações que Deus lhe havia dado para entregar, aceitou tudo isso das mãos do Faraó; e então, mas não antes disso, vieram os anos das abundancias, um após o outro, para cumprir as promessas de José ao Faraó e para reivindicar todas as honras que haviam sido conferidas pelo Faraó a José. (Veja Gênesis 41).

 

Preciosas observações a tudo aquilo que encontra seus originais, sua realidade aconselhada e eterna, nos segredos que existiram entre Deus e Seu ungido! Temos apenas que nos curvar e adorar; e ao recolhemos os despojos e riquezas da Palavra de Deus, para nos regozijarmos e sermos gratos. “Regozijo-me na Tua Palavra como alguém que encontra um grande despojo” (AIBB). “Regozijo-me no caminho dos Teus testemunhos, tanto como em todas as riquezas” (AIBB).

 

Era apropriado que tivéssemos esta amostra do novo mundo, ou da vindoura condição milenar da Terra, na história de José; pois, como dissemos no início, ele é o herdeiro, estabelecido para representar alguém assim na graça de Deus, depois que seus pais contaram, cada um suas diversas partes, na mesma graça frutífera e abundante. A eleição, como vimos, temos em Abraão; filiação, à qual a eleição nos predestina, em Isaque; disciplina, à qual a filiação nos insere, em Jacó; e agora, o herdeiro e a herança que se segue, encerrando o mistério que a graça aconselhou, e encerrando igualmente o livro do Gênesis, em José.

 

José e Asenate 

Não há fala ou linguagem aqui, mas uma voz é ouvida, clara, plena e harmoniosa, pelo ouvido que está despertado. E ao olharmos apenas para José, vemos uma página de história santa, cheia de Jesus; um Jesus rejeitado primeiro, um Jesus ressuscitado e ascendido então, e agora no final, um Jesus milenar, Jesus em Sua herança e reino.

 

“Conhecidas são a Deus, desde o princípio do mundo, todas as Suas obras” (ACF). Mas aquilo que não alcançamos nos ensina isso tão certamente quanto aquilo que alcançamos nos ensina. Ele formou a luz e as trevas. “Teu é o dia e Tua é a noite”. Em toda esta exibição passageira e magnífica da herança, há alguém que deveríamos esperar ver principalmente, e ainda assim não a vemos. Asenate, a esposa, não é encontrada aqui. Ela e seus filhos não recebem nenhuma porção neste grande assentamento de tudo o que existe na terra; eles nem são vistos ou mencionados. Será que eles foram esquecidos? Isso não poderia ser. Mas ela era a mulher celestial, a esposa dada a José dentre os gentios no dia de sua separação de seus parentes, e sua porção é mais excelente do que a terra em suas melhores condições poderia lhe proporcionar; ela está nele e com ele que é o senhor e dispensador de tudo. Asenate está perdida em José; ou, para ser vista apenas em José.

 

E assim o fim completo é contado no início; pois tudo isso no livro de Gênesis é “a dispensação da plenitude dos tempos”, quando Deus reunirá todas as coisas em Cristo, tanto as que estão no céu como as que estão na Terra. E certamente é uma alegria, amados, diante da atual confusão do mundo, em meio à agitação dos pensamentos humanos que está sempre ao nosso redor, aprender pela boca de tais testemunhas, que o fim está diante d’Ele dessa forma, e tem sido assim desde o início. “O conselho do SENHOR permanece para sempre; os intentos do Seu coração, de geração em geração”. Seu povo e Seus propósitos são iguais diante d’Ele; e tais verdades confortaram os apóstolos, quando eles se encontraram no meio das decepções da Igreja (Veja 2 Timóteo 2:19).

 

Parte 4 - O direito de primogenitura (Gn 48-50) 

Esta é mais, posso dizer, um apêndice à história, do que a quarta parte dela. É composta de algumas ações isoladas nos últimos dias de José.

 

A primeira coisa, porém, que obtemos está relacionada com o que vimos ser a característica da própria história. O capítulo 48, que abre esta quarta parte, mostra-nos a concessão do direito de primogenitura a José; e o direito de primogenitura e a herança são, em certo sentido, um só.

 

Em Israel, ou sob a lei, o direito de primogenitura trazia a porção dobrada. O primogênito teria uma participação dupla nos bens do pai; e a lei determinava que este deveria ser seu por um título irrevogável, um título que não deveria ser contestado. A porção dobrada não deveria ser dada a nenhum outro filho da família por qualquer motivo de afeição pessoal ou parcialidade (Dt 21:15-17).

 

Mas embora fosse assim, o direito de primogenitura poderia ter sido vendido ou perdido pelo próprio primogênito. Seus próprios atos poderiam aliená-lo, embora as parcialidades ou preconceitos de seu pai não pudessem ser transferidos. E descobrimos que foi esse o caso. Esaú o vendeu e Rúben o perdeu (Gn 25; 1 Cr 5). No caso da venda por Esaú, Jacó que o comprou, é claro, tinha o título sobre o direito. A oferta e a venda tornaram o direito de primogenitura dele. Isso está claro. Mas no caso de ter sido perdido por Rúben, quem deverá tomá-lo? Ele se reverteu para o pai; mas a qual dos filhos ele o conferiria? Essa foi uma pergunta, e é a essa pergunta que este capítulo responde. Apresenta-nos a solenidade do velho pai, Jacó à morte, investindo José com o direito de primogenitura que Rúben, seu primogênito, havia perdido.

 

Adoção e porção dupla 

Ao saber da doença de seu pai, José chega ao seu leito, trazendo consigo seus dois filhos, Manassés e Efraim. Nenhum dos outros filhos de Jacó está presente. O Espírito de Deus, por meio de Jacó, tem um assunto especial com José.

 

Jacó inicia o ato repetindo a José a concessão divina da terra de Canaã. Esta foi uma exposição da propriedade da família, a propriedade que ele teve que deixar entre seus filhos. Ele então adota os filhos de José; pois isso era necessário para que eles fossem investidos com os direitos dos filhos, visto que, num grande sentido jurídico, eles eram estranhos para Abraão. A mãe deles era egípcia. Eles eram uma semente, portanto, que a lei, em seus dias, os teria despedido (Ed 10:3). Mas Jacó os adota. Ele os leva para a família. “Agora, pois,”, diz ele a José, “os teus dois filhos, que te nasceram na terra do Egito, antes que eu viesse a ti no Egito, são meus”. Eles são constituídos da semente de Abraão e feitos filhos de Jacó; e isso feito, Jacó imediatamente os coloca no lugar dos primogênitos; pois ele acrescenta imediatamente: “como Rúben e Simeão”.

 

Este foi um ato solene de investidura, pelo qual os direitos do mais velho, a porção dupla associada à primogenitura, passaram para José na pessoa de seus dois filhos. Leia sobre isso em 1 Crônicas 5 e Ezequiel 47:13. (O título agora concedido foi posteriormente realizado, quando a propriedade da família, a terra de Canaã, passou a ser dividida entre as tribos; pois José então recebe duas porções em seus dois filhos, que são tratados como se tivessem sido dois filhos distintos de Jacó).

 

A recompensa da herança 

Mas ainda temos que perguntar: Por que José foi preferido assim? O direito perdido foi revertido para Jacó e de suas mãos teve que ser concedido novamente. Mas por que foi dado a José? Isso foi mera graça? Eu não poderia dizer isso. Graça, eu sei, nesta grande ocasião, segue seu caminho. Se estivéssemos devidamente esvaziados, deveríamos nos deleitar no caminho da graça, mesmo que nós mesmos pudéssemos receber, em suas distribuições, apenas uma bênção da mão esquerda ou de Manassés. Mas embora tudo isto seja assim, ainda questiono se foi meramente graça que conferiu os direitos do filho mais velho a José.

 

Prefiro julgar que José mereceu. Se Jacó o comprou anteriormente, creio que José agora o ganhou.

 

Já rastreamos, na história, seu caminho até a herança. Foi o caminho, como o de seu divino Mestre, cuja sombra ele era ao longe, de tristeza, rejeição e separação, e ainda assim de justiça e testemunho. E este caminho terminou com louvor, honra e glória no reino ou herança; e o direito de primogenitura está relacionado com a herança.

 

É, portanto, fácil para nós dizermos, como dissemos, que José conquistou o direito de primogenitura. Judá ganhou a realeza, Levi o sacerdócio e, portanto, José a porção dobrada. E seu pai deu-lhe um penhor, “um penhor da herança”, que era característico disso; pois no final desta ação Jacó lhe diz: “E eu te tenho dado a ti um pedaço de terra mais que a teus irmãos, o qual tomei com a minha espada e com o meu arco da mão dos amorreus”. Isso era um penhor. Mas não só isso; foi uma amostra também. Foi característico. Falava da herança como deveria estar nas mãos de José. Esta parte foi ganha, e a de José também. A espada de Jacó conquistou este pedaço de terra, assim como a paciência de José conquistou a herança e o direito de primogenitura; e é de acordo com isso que o pai, à morte, depois o celebra. “As bênçãos de teu pai excederão as bênçãos de meus pais, até à extremidade dos outeiros eternos; elas estarão sobre a cabeça de José e sobre o alto da cabeça do que foi separado de seus irmãos”. Ou como Moisés, o homem de Deus, diz dele: “a bênção venha sobre a cabeça de José e sobre o alto da cabeça do que foi separado de seus irmãos”.

 

O apóstolo fala do “galardão da herança”, palavras que podem não soar como se combinassem exatamente uma com a outra; pois a herança vem da graça e a recompensa vem do trabalho. Assim, o Senhor fala em dar “uma coroa de vida”, palavras que também podem soar aos ouvidos como um tanto discordantes; pois a vida é uma graça e uma coroa é uma recompensa. Mas a alma aceita essas coisas e não faz delas uma dificuldade. “Todas as bênçãos compradas e prometidas estejam contigo”, disse o mártir próximo à morte à sua esposa. E ele falou sabiamente, assim como abençoadamente; pois as bênçãos, em certo sentido, são todas adquiridas; em outro, prometidas ou dadas. Como diz um doce hino, que todos nós conhecemos:

 

“Senhor, creio que Tu preparaste,

 Por mais indigno que eu seja,

 Para mim uma recompensa gratuita comprada com sangue,

 Uma harpa de ouro para mim”.

 

E José, eu julgo, obteve o direito de primogenitura ou a herança desta forma. Estava em suas mãos “o galardão da herança”. Foi uma coisa comprada e, ainda assim, uma coisa dada; uma coisa conquistada e, ainda assim, uma coisa gratuita. Vemos graça na concessão dela a ele, mas vemos também o fruto ou resultado daquele caminho de tristezas dos mártires que ele, e somente ele, de todos os filhos de Jacó, trilhou com paciência e triunfo.

 

Esta ação, portanto, está em plena sintonia com o caráter principal da história de José. Vemos nele o herdeiro, e com isso o direito do primogênito, a porção dobrada, com seu penhor, “o penhor da herança”, entregue a ele, na ação deste capítulo.

 

No próximo capítulo (Gênesis 49) José é apenas um dos muitos filhos de Jacó – Jacó, o pai, é o principal. José e seus irmãos estão juntos sob o olhar e os pensamentos do patriarca próximo à morte, que foi guiado pelo Espírito para lhes dizer o que lhes aconteceria nos últimos dias. Não faço mais nenhuma referência a isso aqui, mas me refiro à história de Jacó, onde já a considerei.

 

O caráter e as virtudes de José 

No último capítulo (Gênesis 50) José é novamente o principal; não, entretanto, tanto misticamente quanto pessoalmente; isto é, não como herdeiro, mas como homem. Vemos aqui o próprio José, seu caráter e suas virtudes, em vez do senhor do Egito, sua posição e suas dignidades. E considerado pessoalmente, ele é talvez o caráter mais atraente do livro de Gênesis. Há mais fruto e força da piedade nele do que em qualquer um de seus pais. Temos nele o caminhar mais firme e consistente nos caminhos de Deus. Há menos elevação, eu percebo, do que em Abraão, assim como, é claro, há menos exercício de espírito do que em Jacó; mas apesar de todas as circunstâncias, provações, honras, mudanças, ele ainda é o homem de Deus que andou em Seu temor e diante d’Ele. A sua história não é feita de fracassos e recuperações, nem de refazer as primeiras obras. É um caminho de luz, se não de uma luz que brilha cada vez mais até se tornar um dia perfeito, mas de uma luz que brilha clara, calma e constante. Na sua história não temos visitas angélicas, nem aparições do Senhor, nem audiências de oráculos divinos; mas no próprio José temos um vaso usado por Deus, porque foi aprovado por Ele; uma coisa muito preciosa para com Deus. Não é Peniel ou Berseba novamente, refrigérios e iluminações ocasionais, mas sim um testemunho permanente dentro de si, de modo que ele conhecia o caminho de Deus e o guardava. “até ao tempo em que chegou a Sua Palavra; a Palavra do SENHOR o provou”. A autoridade que o Egito, no devido tempo, reconhecia nele, ele já a havia reconhecido no Senhor. Ele próprio era o obediente e depois se tornou aquele estabelecido em autoridade. Ele continuou como Cristo em Suas tentações, e então foi designado para um reino. A sujeição foi o seu caminho para a honra, o devido caminho de todos os herdeiros do mesmo reino.

 

Singularidade na vida de José 

Mas existem algumas peculiaridades na história de José além disso. Não encontramos com ele o altar e a tenda, como encontramos com seus pais. Porque não é o caráter de estrangeiro na Terra que vemos nele, mas a herança ou o reino, depois do sofrimento e da humilhação. Não é a tenda de seus pais que vemos em sua história, mas a cova e a prisão, que eram somente dele, e não de seus pais. A tenda e o altar podem ser devidamente os símbolos da vocação deles; a cova e a prisão primeiro, e depois o trono, tornam-se os símbolos de José.

 

E como outra peculiaridade, podemos observar que o Senhor nunca é chamado de Deus de José, pois é chamado de “o Deus de Abraão, e o Deus de Isaque, e o Deus de Jacó”. Mas isso, da mesma forma, podemos explicar. José estava mais entre os filhos do que entre os pais. O concerto não foi feito com ele, como havia sido com Abraão, Isaque e Jacó, nem ninguém foi separado para que ele pudesse receber a bênção. O concerto foi feito com Abraão separado do país, da parentela e da casa paterna. Foi renovado com Isaque, com a separação de Ismael. Foi renovado novamente com Jacó, com a separação de Esaú. Mas não foi renovado com José; pois ele era apenas um dos filhos de Jacó, e todos estavam igualmente interessados nisso; todos eles eram a semente contemplada por ele; e José não era mais dessa semente do que qualquer um dos outros. De modo que não temos base para o título característico, “o Deus de José”. Pois, embora a graça tenha sido demonstrada no chamado de Abraão, e novamente na escolha de Isaque, o mais jovem, e na escolha de Jacó, o mais jovem, ela foi manifestada em José apenas em sua medida comum em favor de toda a semente, uma medida que chegava aos outros assim como a ele. (Depois disso, Deus é chamado de “o Deus de Israel”, como antes foi chamado de “Deus de Abraão, de Isaque e de Jacó”, porque Seu concerto foi com a nação de Israel).

 

Assim, José ocupa o seu lugar aos nossos olhos, e nós olhamos para ele moralmente ou misticamente; com suas características, virtudes, ou em seu lugar típico peculiar. Mas ainda não terminamos de vê-lo.

 

As lágrimas de José 

Ele era, eu acrescentaria agora, um grande chorador.

 

Paulo diz que se lembrava das lágrimas de Timóteo; e havia muitas lágrimas nos olhos de José, às quais poderíamos muito bem nos lembrar. Davi e Jônatas choraram, assim como Paulo e Timóteo. Mas eu poderia afirmar que José superou todos eles. As ocasiões de suas lágrimas foram as mais variadas. E, de fato, é um fluxo sincero, real e genuíno de afeições que devemos cobiçar em meio às realizações mais cultivadas e ordenadas dos dias de hoje. As lágrimas são muitas vezes coisas preciosas e às vezes santas também.

 

No início, quando José viu a convicção despertar na consciência de seus irmãos, ele chorou. Foram lágrimas de tristeza e de gozo. Ele sentiu pena deles passando pela agonia; mas ele deve ter se regozijado ao ver a necessária flecha atingindo seu alvo e o sangramento dos ferimentos que se seguiram.

 

Ele chorou novamente quando viu Benjamin. O filho de sua própria mãe, seu único filho além dele, cujo nascimento também foi a morte dela, e o único entre os filhos de seu pai (que eram todos antes dele) que não era culpado de seu sangue. Alguém como este foi visto naquele momento por ele em Benjamin. Essas lágrimas, portanto, a natureza poderia explicar.

 

Ele chorou novamente ao ver a obra de arrependimento acontecendo em seus irmãos. À sua maneira, ele ansiava muito por eles; até que finalmente as palavras de Judá foram demais para ele; a convicção da consciência terminou então na restauração do coração. “Um velho pai” e “um moço” repetidas vezes nos lábios de Judá tiveram uma expressividade que predominou, e José não conseguiu mais se conter. Ele levantou sua voz em choro, e a casa do Faraó o ouviu. Mas estas foram mais do que lágrimas da natureza. Estas foram as entranhas de Cristo, ou as lágrimas do Pai no pescoço do pródigo.

 

Cada um desses choros foi maravilhoso em sua ocasião; mas ainda temos mais.

 

Ele se lançou sobre o rosto de seu pai e chorou sobre ele, pois seu pai acabara de expirar. Isto foi como o túmulo de Lázaro para José; e lá ele e seu Senhor podem chorar juntos.

 

E novamente ele chorou, quando, após a morte de seu pai, seus irmãos começaram a suspeitar de seu amor. Ele ficou desapontado. Uma indigna recaída dos caminhos de um amor constante, paciente e servidor, o fez chorar – no espírito d’Aquele, posso dizer, que chorou por Jerusalém. Durante anos ele vinha fazendo tudo o que podia para conquistar a confiança deles. Ele os alimentou e aos seus pequeninos. Anos agora haviam passado, e não encontramos nenhuma repreensão deles em sua vida ou em seus caminhos. A dor pela morte do pai acabara de lhes dar a conhecer os afetos comuns que tinham para uni-los. Ele lhes forneceu todos os motivos para confiar nele. E ainda assim, depois de tudo, eles estavam temendo a ele. Este foi um choque terrível para um coração tal como o de José. Mas ele não se ressentiu, exceto pelas suas lágrimas e renovadas garantias de seu amor diligente e fiel. E não têm lágrimas como essas, pergunto eu, um caráter tão excelente quanto as lágrimas podem ter? Elas eram como as pulsações do espírito magoado do Senhor. “Até quando estarei ainda convosco e vos sofrerei?”; “Por que temeis?”; “Estou há tanto tempo convosco, e não Me tendes conhecido...?” Estas eram pulsações semelhantes de um coração magoado em Jesus. Jesus santificou as lágrimas e fez delas, como tudo o mais que subia d’Ele a Deus, um sacrifício de cheiro suave; José, Davi e Paulo, sim, Jônatas e Timóteo também as tornaram preciosas e as colocaram entre os tesouros do Espírito no seio da Igreja.

 

Graça e fidelidade 

Tal pessoa era José, e em tal companhia o colocamos; novamente, digo, talvez o caráter mais atraente do Livro do Gênesis. Vemos nele a graça e a irrepreensibilidade que obtemos em Isaque, a “piedade”, como falamos, marcando-o em todas as suas relações na vida. Mas nisso havia uma combinação que não encontramos em Isaque. Havia firmeza – tanto energia quanto sensibilidade.

 

Resta-lhe cumprir o último dever desta piedade em memória de seu pai; e ele faz isso, nem precisamos dizer, com toda graça e fidelidade. Ele enterra seu pai, como seu pai queria, na terra de Canaã. Mas tudo é conduzido com muita solenidade – e a ocasião é tal que devemos nos deter sobre ela por um breve momento.

 

Adoração simples e funerais 

Em outros tempos, a adoração era uma cerimonia magnífica. Templos, altares, festas, dias santos, sacrifícios e similares, a adornavam, e oficiais de diferentes ordens, em vestimentas apropriadas, a conduziam. Porque naqueles dias a adoração apontava para certos grandes mistérios que deveriam ainda ser realizados. Mas agora esses mistérios foram cumpridos na manifestação de Cristo, Sua Pessoa, obra, sofrimentos e vitórias – de modo que essa suntuosa adoração é agora apenas uma reprovação a tudo o que é encontrado n’Ele, em sua plena substância e eficácia.

 

Tanto quanto aos funerais, bem como ao culto. Em outros tempos, eles deviam ser magníficos. Porque a ressurreição estava então apenas em perspectiva; e os funerais eram então uma espécie de penhor da ressurreição esperada; e era apropriado que o penhor fosse magnífico de acordo com a glória daquilo que era prometido. Mas agora, uma vez que a ressurreição foi realizada na Pessoa do Senhor Jesus, o Filho de Deus, o magnífico funeral, como a cerimoniosa adoração, é antes uma reprovação, como se o grande mistério em si ainda não tivesse sido realizado em sua substância e eficácia. Pois não é a pompa fúnebre que agora é a garantia da nossa ressurreição vindoura – a ressurreição do Senhor é essa garantia, as primícias de uma colheita prometida.

 

Consequentemente, o culto e os funerais devem agora, com a mesma simplicidade, manifestar a fé da Igreja nos mistérios consumados. Estamos agora à vista da vitória do Senhor Jesus. Não damos nem recebemos mais promessas sobre eles, como acontece nas ordenanças, mas os celebramos. José de Arimateia deu ao corpo do Senhor um enterro de grande valor, como José, filho de Jacó, aqui dá ao corpo de seu pai amado e honrado. Lemos sobre Jesus: “E puseram a Sua sepultura com os ímpios e com o rico, na Sua morte”. Naqueles dias de José de Arimateia, o sepulcro não havia sido rompido; e as promessas, portanto – as promessas como estas, feitas no dia do Patriarca – ainda podiam ser feitas. Mas no sepultamento do Senhor Jesus vemos corretamente a última dessas promessas; porque n’Ele vemos as primícias dos que dormem. Os lençóis e o lenço que ele deixou no sepulcro vazio como despojos de uma guerra gloriosa, e troféus que falam de uma vitória gloriosa. A morte foi vencida e a fé agora celebra o que os ofícios e costumes, bem como as ordenanças e cerimônias, antes apenas prometiam e prenunciavam. E deixe-me acrescentar que a fé aprendeu esta lição, pois o sepultamento que se seguiu ao de Jesus não teve nem embalsamamento nem magnificência. Foi logo realizado, com total reverência e amor. “E uns varões piedosos foram enterrar Estêvão e fizeram sobre ele grande pranto”.

 

Se tivéssemos fé, deveríamos valorizar profundamente tudo isso. Nossos privilégios são realmente grandes. Agora, nos serviços da casa de Deus, a mesa sucedeu o altar e, em vez de um sacrifício, temos uma festa sobre um sacrifício. E também devemos ver a morte e o sepultamento à luz da ressurreição de Jesus.

 

Simplicidade da fé 

Notamos essas coisas em relação ao funeral de Jacó. A sua morte tem a sua operação moral na família, trazendo à tona (como acontece frequentemente quando o chefe de família é tirado) o que antes não se suspeitava que ali existisse. Mas devo meditar sobre isso por um tempo.

 

A simplicidade da fé patriarcal é notável. Ela era como suas maneiras – belas por sua naturalidade. Não havia nada do espírito de escravidão nos santos de Gênesis. Os patriarcas caminharam com a certeza disso, que Deus era o seu Deus, Suas promessas eram a sua porção, e a cidade e a terra da glória eram a sua herança. Eles viveram e morreram neste espírito de fé. Nenhuma suspeita ou reserva, nenhum questionamento, nenhuma desconfiança na graça contamina suas almas. E isso é certamente ainda mais estranho porque, embora em nenhum lugar entre eles encontremos esse espírito de escravidão, nós o vemos em todos os outros lugares, imediatamente depois de deixarmos o livro de Gênesis, e depois em toda a Escritura. Seria vão seguir todos os avisos fornecidos pela Escritura. Isso opera natural e abundantemente em nós. Certamente sabemos disso em nós mesmos e vemos isso ao nosso redor.

 

Como é, então, que isso não se manifesta nos Patriarcas? Seria porque eles eram testemunhas constantes a si mesmos da graça e da eleição de Deus e nunca ouviram a voz da lei? Isso ajudou a formar suas mentes, podemos ter certeza. Mas, além disso, esta ausência do espírito de escravidão era maravilhosamente consistente com a sua posição dispensacional; pois eram como crianças que nunca haviam saído de casa. Eles estavam na infância e não podiam mover-se na presença de Deus com um espírito de medo e incerteza, assim como uma criança, antes de sair de casa, não poderia ser tentada a questionar seu direito à criação e ao abrigo da casa de seu pai. E é pela beleza moral e perfeição deste livro de infância de Gênesis que vemos ali essa fé infantil e inquestionável nos santos de Deus. Eles cometem faltas, e isso também, às vezes, por falta de fé, quando certas circunstâncias os pressionam; mas suas almas nunca são contaminadas por um espírito de desconfiança e escravidão. Vemos isso o tempo todo – pelo menos até chegarmos ao momento em que nos despedimos do livro e tendo ido além do que é propriamente o caráter patriarcal dele. Quero dizer, nos irmãos de José, assim que o funeral de Jacó terminar.

 

Confiança no próprio Jesus 

Pareceu então que eles não estavam confiando em seu irmão com uma confiança sincera e feliz. Havia um objeto de interesse comum entre eles, e esse era o segredo de sua confiança, em vez ser o próprio José. Eles não tiveram ousadia por causa do que José era e do que ele havia feito, mas confiaram em uma circunstância. A presença de Jacó foi o apoio de seus corações. Eles se arrependeram; eles foram convencidos e vivificados; mas ainda assim, a confiança deles não honrou José, como José muito merecia da parte deles.

 

E isso pode conter uma palavra para nós. Podemos nos perguntar: se o apoio e a comunhão dos outros fossem retirados, descobriríamos que toda a nossa confiança sempre esteve em Jesus? Que aprendemos tanto da graça que podemos permanecer na presença da glória revelada? Que a remoção de Jacó não ofusca a atmosfera em que nossa alma tem habitado?

 

Conhecimento da fé 

Mas agora estamos chegando ao fim dos tempos de José. No entanto, antes de testemunharmos a sua morte, temos (oportuno para notarmos isto neste nosso dia agitado) um excelente exemplo de familiaridade da fé com o curso da história do mundo.

 

Não falo do conhecimento de um profeta sobre o que está para acontecer entre as nações, como Daniel tinha, quando contou sobre o surgimento de uma besta após outra, e da grande imagem desde sua cabeça de ouro até os dedos dos pés, de ferro e barro. Tal conhecimento veio pelo Espírito, o Senhor enchendo o coração de Daniel, e de outros como ele, com Sua própria luz. Falo apenas do conhecimento da fé sobre o curso das coisas que a história das nações deve seguir.

 

José diz a seus irmãos: “Eu morro, mas Deus certamente vos visitará e vos fará subir desta terra para a terra que jurou a Abraão, a Isaque e a Jacó”.

 

Os filhos de Israel estavam naquela época muito felizes na terra do Egito. Eles estavam no pleno favor do rei; eles possuíam a porção mais rica do país e tinham um deles como a segunda pessoa do reino. Nem um único sintoma de perigo ou de mudança apareceu em todas as suas condições. E o próprio José estava tão feliz quanto as circunstâncias o podiam deixar. “E viu José os filhos de Efraim, da terceira geração; também os filhos de Maquir, filho de Manassés, nasceram sobre os joelhos de José”.

 

Mas no meio de tudo isso, José fala de Deus visitando-os; palavras que indicam que dias de tristeza estão próximos, dias em que Deus seria então seu único Amigo e Ajudador.

 

Estranho era isso, muito estranho! Quem poderia acreditar? José estava sonhando? Estadistas e políticos poderiam ter dito. Mas não; José não estava sonhando. A Palavra de Deus era sua sabedoria. O oráculo divino em Gênesis 15 havia previsto que o Egito afligiria Israel, mas que Deus os favoreceria com eles e os traria de volta para Canaã – e essa Palavra de Deus era tudo para José, era tudo para a fé – as aparências não eram nada. O oráculo havia falado isso. José creu e lembrou-se disso. E assim, pela fé, José viu a aflição de Israel no dia da mais brilhante promessa e prosperidade de Israel – ele viu a inimizade do Egito neste dia de amizade do Egito – ele viu olarias e maiorais de tributos nos formosos campos e na colheita ensolarada de Gósen. Assim como Noé, pela mesma fé, certa vez viu um mundo inundado durante 120 anos de sucessivas épocas de semeadura e colheita, segas e colheitas de verão, épocas de compra e venda, plantio e construção.

 

Este foi o conhecimento da fé a respeito do curso futuro das coisas. E fé, nos nossos dias, é ser como um político e saber algo sobre o curso das coisas à luz da Palavra de Deus, apesar de todas as aparências. E este é o único ato na vida de José que é registrado como de fé em Hebreus 11. É desta forma notavelmente que ele se destaca em meio a tantos atos de fé e piedade, e de tal forma de caminhada com Deus, como vimos nele. Mas valeu a pena ser tão sinalizado. Foi um grande testemunho de que José vivia pela Palavra de Deus, em meio às atrações e ocupações do mundo, e com uma mente superior a todas as aparências presentes. Abraão foi instruído, por visões e audiências divinas, sobre esta história vindoura de Israel no Egito; José usou apenas o que Abraão havia recebido. Não temos visitas do Senhor a José, como temos a Abraão. José, se você preferir, não estava na altura de Abraão. Mas temos nele o que é moralmente mais importante, a luz e a certeza de uma mente crente, as apreensões e decisões de fé. Ele se lembrou do que Abraão tinha ouvido e agiu de acordo com o que lembrou. O que lhe faltava em elevação pessoal, como oráculo de Deus, ele tinha, em poder moral, como crente em Deus. E se eu precisar escolher entre eles, prefiro crer a ser inspirado. E José creu quando, como lemos, “fez menção da saída dos filhos de Israel e deu ordem acerca de seus ossos” (Hb 11:22). Este era o conhecimento político da fé, por assim dizer – o conhecimento da fé com as coisas que estavam acontecendo na Terra. E foi isso que tornou Noé ou José mais sábio do que todos os senadores dos reinos. Sabemos bem como as palavras de José foram vindicadas e como as inesperadas olarias contaminaram as boas terras de Gósen e como os maiorais de tributos levaram Israel ao seu trabalho. Assim como antes, nos dias de Noé, as águas cobriam os topos das montanhas, e um navio, aparentemente com toda a loucura construído para terra firme, logo se tornou a única arca de segurança num mundo inundado.

 

Fé hoje 

E eu pergunto: não será ainda assim com a fé? Será que não temos, pela fé na Palavra de Deus, a garantia de conhecer o rumo que este mundo, com todo o seu refinamento crescente e progresso variado, está tomando a cada momento? Não temos motivos para saber que está a caminho do julgamento? Na verdade, nós temos. O Senhor Jesus tem sido rejeitado neste mundo. Esse é o fato que dá ao mundo seu caráter diante de Deus. Nenhum avanço na ordem civil e na cultura, nenhuma propagação, mesmo da Sua própria verdade, entre as nações, poderá aliviar o mundo do julgamento que o aguarda por causa deste ato. Que o dia seja tão claro quanto foi o dia do egípcio José para Israel, a fé sabe que “a superfície polida” logo será quebrada. As circunstâncias nunca dão à fé o seu objeto. É a Palavra de Deus que faz isso; e as circunstâncias e as aparências não devem desviar o olhar da fé de seu objeto. A casa, varrida e adornada como está atualmente, promete muito. O mesmo aconteceu com a terra de Ramessés e a amizade do Faraó, nos dias de Gênesis 50. Mas tais promessas são palavras vãs aos ouvidos da fé; ela não as considera. Como Jeremias disse ao rei de Judá, quando o exército aliado chegou e o exército hostil se desfez e foi embora: “Não enganeis a vossa alma”; então a fé diz, nesta hora, à geração que se vangloria do progresso: “Não enganeis a vossa alma”. A fé diz isso com ousadia; pois bem sabe que o último estado da casa varrida e adornada é pior do que o primeiro.

 

Realidade invisível 

José então deu prova de que cria no que testificava. Como Jacó, seu coração estava em Canaã, a terra do concerto, a terra dos sepulcros de seu pai. E, como Jacó, ele prestou juramento a seus irmãos, dizendo: “Certamente, vos visitará Deus, e fareis transportar os meus ossos daqui”. O mundo invisível era algo real para ele, como fora para seus pais. O chamado de Deus ligou todos eles com aquilo que estava além da morte, e seus pensamentos e seus corações estavam lá antes deles mesmos. Era tão natural para eles morrer quanto viver.

 

“E morreu José da idade de cento e dez anos”.

 

Seus irmãos, os filhos de Israel, foram fiéis a ele, como ele fora a seu pai Jacó. Eles embalsamaram seu corpo imediatamente. Depois disso, Moisés levou-o consigo para fora do Egito; e, por fim, Josué o enterrou em Siquém, na terra de Canaã. (Veja Gênesis 50:26; Êxodo 13:19; Josué 24:32).

 

Deus manifestado em Gênesis 

Encerramos assim a história de José, e com ela o livro de Gênesis, o livro da criação e dos primeiros caminhos de Deus, o livro também dos patriarcas, das primeiras famílias dos filhos dos homens e da era da infância dos eleitos de Deus.

 

Acho que sentimos, ao deixar este livro, que de certa forma estamos descendo a um nível mais baixo. Creio que isso será geralmente percebido.

 

Em Gênesis, o Senhor está Se manifestando; depois Ele está expondo o homem. O homem não estava sob a lei, como dissemos, durante a época deste livro. Ele foi preparado para aprender a Deus sob muitas e diferentes expressões e revelações de Si mesmo. Mas assim que a lei entra, e isso ocorre muito rapidamente depois de deixarmos este livro, o homem é necessariamente trazido à frente, e temos que vê-lo, não simplesmente como sob o chamado de Deus, mas em seu próprio lugar e caráter. E certamente isto é suficiente para nos fazer sentir que estamos, em certo sentido, num terreno mais baixo. É claro que, no desenrolar dos conselhos, na aplicação dos recursos de Deus sobre as falhas do homem, e nas demais manifestações do próprio Deus sobre a exposição do homem, estamos avançando em todo o volume, do começo ao fim.

 

Mas, por mais variados e maravilhosos que sejam esses conselhos, que são revelados à medida que avançamos na Escritura, por mais multiforme que a sabedoria de Deus seja, como sabemos que é, ainda assim podemos dizer que cada parte dela recebe alguma atenção ou prenúncio neste livro de Gênesis. Estas são fracas e obscuras, mas os rudimentos de toda a linguagem são encontrados nesta lição introdutória e infantil. Expiação, fé, julgamento, glória, governo, chamado, o reino, a Igreja, Israel, as nações, concertos, promessas, profecias, com o próprio Deus bendito em Sua santidade, amor e verdade, as obras de Sua mão, e a obra e os frutos do Seu Espírito, tudo isso e assim por diante aparecem neste livro. A criação foi exibida no início. Maculada e arruinada pelas mãos do homem, a redenção foi publicada. Os céus e a Terra são então mostrados como cenas de redenção (como haviam sido no início da criação) nas histórias de Enoque e Noé. E então, em Abraão, Isaque, Jacó e José, temos o homem (o principal sujeito da redenção, como é claro que ele é) em sua eleição, adoção, disciplina e herança. Esses mistérios foram examinados nesta série e estão sob os olhos e para a observação de nossa alma, à medida que passamos de uma dessas histórias para outra.

 

E aprendamos a dizer, amados, para o louvor d’Aquele que estendeu tais criações vivas diante de nós, que se os céus manifestam a glória de Deus e o firmamento anuncia a obra de Suas mãos, o mesmo ocorre com não menos clareza e certeza as páginas da Escritura manifestam os sopros de Seu Espírito.

J. G. Bellett

 

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