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Os Patriarcas - Cantares 2 - Parte 16/18

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ÍNDICE


 

Os Patriarcas

John Gifford Bellett

 

Cantares de Salomão

Parte 2


Poemas Alegóricos 

Quanto à estrutura do livro como uma composição, não tenho dúvida, nem por um momento, da correção daqueles que o tratam como “uma coleção de idílios distintos ou pequenos poemas perfeitamente destacados e separados uns dos outros, sem outra conexão além da que eles derivam de um tema comum, as peculiaridades do estilo de um autor comum, e talvez alguma unidade de design no sentido místico, que pretendem apresentar”. Os sentidos espirituais dos santos devem ser exercitados no discernimento dos inícios e finais destes diferentes cânticos ou pequenas canções, e na interpretação dos santos mistérios que eles expressam. Certamente, podemos esperar diferentes luzes e diferentes regozijos ao fazê-lo entre nós. Mas que estas canções ou pequenos poemas são alegorias, nenhum de nós duvidará. As relações íntimas de um casal de noivos são as imagens; o amor de Cristo e do santo, o sentido místico. E garantidas, tenho certeza, são as sugestões de alguém sobre este assunto, “que existem aquelas manifestações de Seu amor, e aquelas afeições acesas no coração para com a Pessoa do Filho de Deus, que podem muito bem tomar emprestadas suas alusões do afeto mais terno e poderoso que subsiste entre os homens”. “E como o noivo se alegra da noiva, assim o teu Deus Se alegrará de ti” (TB); “O SENHOR, teu Deus, está no meio de ti, poderoso para te salvar; Ele Se deleitará em ti com alegria; calar-Se-á por [descansará em – JND] seu amor, regozijar-Se-á em ti com júbilo”; “Assim o rei desejará a tua formosura” (TB); “Tu ficarás Comigo muitos dias... assim quero Eu ser também para ti”; “Vós, maridos, amai vossa mulher, como também Cristo amou a igreja”. Estas e passagens semelhantes, com muitas histórias típicas na Escritura e algumas ordenanças da lei, todas justificam esse pensamento, bem como o caráter das muitas atuações do Espírito na alma dos santos.

 

A autoridade divina deste livro nunca foi questionada de alguma forma digna da menor consideração por parte daqueles que andam simplesmente na luz de Deus, recusando o homem, os seus pensamentos e a sua sabedoria. “Onde está o sábio? Onde está o escriba? Onde está o inquiridor deste século?” Foi sempre reverenciado pelos Judeus como parte dos oráculos de Deus e, nesse caráter, podemos assegurar-nos, recebeu a sanção de Cristo e do Espírito Santo nos apóstolos. Ninguém deveria parar por um momento para admitir o seu valor para a alma do santo. “Podemos”, como bem disseram, “formar apenas uma suposição sobre algumas de suas belezas, mas, nas mãos de um Cristão, ela é investida de um brilho mais intenso do que poderiam ter discernido aqueles que as leram nos dias de Salomão. Pois, embora, no que diz respeito às imagens exteriores das alegorias, algumas de suas belezas possam ser perdidas, o sentido místico oculto é trazido mais à luz e manifestado com mais plena certeza ao crente sob a dispensação do Evangelho. ‘Porque em verdade vos digo que muitos profetas e justos desejaram ver o que vós vedes e não o viram’”.

 

Comunhão baseada na aceitação 

Não há neste livro nenhum questionamento sobre o fato, a base ou a natureza de nossa aceitação por Deus. Tais questões e indagações são resolvidas previamente. A comunhão está no estabelecimento de todas elas, como já observei. A aceitação diante de Deus é conhecida. O que temos aqui é o deleite em Cristo, a ocupação com Ele mesmo. Não é a descoberta d’Ele, nem é a confissão dos pecados. A comunhão é a comunhão de um pecador, certamente – mas é de um pecador conscientemente perdoado, aceito e amado. E quando qualquer tristeza ou arrependimento é sentido ou reconhecido, não é por qualquer mancha ou transgressão aberta, mas por algum retrocesso espiritual, alguma frieza momentânea, alguma fraqueza em manter ou cultivar o devido fervor da alma. Isso deve ser muito observado. Nada grosseiro, ou mesmo evidente, na conduta – nada estabelecido como um hábito é detectado aqui – nada que uma alma que ainda não estivesse em comunhão simples e sincera com Jesus pudesse ficar apreensiva. É apenas uma preguiça de coração presente e temporária. O próprio arrependimento e confissão são de tal natureza que indicam o tom delicado da alma que poderia senti-los e expressá-los. O contato ou toque é tão terno que a própria percepção dele fala da delicadeza do coração que o percebeu e se ressentiu.

 

Alegria do Senhor como nossa força 

Mas que elemento é este! Oh, quão grosseiras, amados, são nossas sensibilidades comparadas com tudo isso. Nossa pobre alma raramente se envolve nisto; muitas vezes ela está empenhada em fazer novamente as primeiras obras, em lamentar as vantagens que nossas concupiscências tiraram de nós, as surpresas que o calor dos temperamentos errados causaram e coisas semelhantes. Mas toda essa ocupação da alma nos mantém aquém desse deleite puro e espiritual em Cristo, dessa doença do amor, dessa respiração nas montanhas de mirra, e desse cultivo e manutenção do jardim de especiarias, aqui tão abençoadamente apresentado. Certamente sabemos pouco disso. Será que Deus é nossa maior alegria? É nos aposentos do Rei e em pensamentos de glória que caminhamos? Estará nosso nardo saudando nosso Senhor? Nossa alma é capaz de chamá-Lo nada menos que nosso “Amado”? Na verdade, seria bom se afeições como essas preenchessem e comandassem nosso coração. Então deveríamos ter armas de vitória segura para enfrentar nossos inimigos e derrotar os desejos e pensamentos intrusivos que tantas vezes nos contaminam. No estilo figurativo de alguém, podemos dizer: “Como quando, numa manhã clara, o Sol nascente se concede visitar-nos, as estrelas brilhantes que adornavam o nosso hemisfério, bem como as sombras escuras que o obscureciam, desaparecem”. A concupiscência não poderia, com qualquer poder, vir contra uma alma ocupada com isso. Esta “alegria do Senhor” seria de fato a nossa “força”. Pois que morada se abre aqui para a fé entrar! Que casa de banquetes para a alma! Quão distantes do medo e da obscuridade de consciência estão essas regiões! A terra da rola é esta, o jardim de todos os frutos excelentes.

 

Mas onde está a fé preciosa para entrar e caminhar até lá? Precisamos clamar por largueza de coração nas entranhas de Cristo Jesus. Ocupar-se com tais afeições traz influência para toda a alma. Isso a fortalece e a santifica – pois todas as questões de nossa posição são antecipadas, e nossa energia para enfrentar a tentação é aumentada, e por meio disso a liberdade e a pureza da alma são asseguradas. Pois como pode ser nutrida a ideia de condenação ou a tentação que traz contaminação, quando o crente está procurando alcançar mais a luz e o gozo de uma comunhão como esta? Isso não o leva a mais do que uma mera fuga de um espírito de escravidão ou do mal prático? Não é este o método divino de torná-lo mais do que um conquistador?

 

A moral do Livro 

Por expressar uma comunhão como esta, este livro dos Cantares de Salomão pode servir a qualquer santo. Não quero dizer, porém, que possamos necessariamente seguir um caminho de experiência e passar de um estágio para outro. Mas de acordo com o conhecimento cada vez maior que a alma tem de Jesus, assim será, naturalmente, a sua experiência cada vez maior. E deveria haver progresso – como lemos: “Crescei na graça e no conhecimento de nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo”. E à medida que as diferentes relações que o Senhor mantém conosco são apreendidas e abraçadas pela alma, surgirão experiências correspondentes, pois a experiência é a nossa entrada no poder dessas relações. E julgo que os Cantares de Salomão são as declarações da alma em um ponto desta jornada, desde a primeira vivificação até o desfrute completo e final. Não é a experiência de Rebeca quando se levantou para deixar a Mesopotâmia, nem de Rute, quando se preparou, em Moabe, para tomar o Deus de Noemi como seu Deus, nem como depois uma respigadora no campo – é o exercício do coração de Rebeca, enquanto em seu caminho até Isaque, ouvindo as histórias de seu gracioso e sábio condutor, e de Rute aos pés de Boaz, como pretendente de sua mão e seu nome.

 

Esta é a moral geral do livro. Mas sendo assim, posso admirar ainda mais a perfeição do Espírito ao fazer deste um livro curto. É um caráter muito íntimo para ter sido muito divulgado. Ele permanece no interior. São os recessos do templo. Foi chamado pelos Judeus de “Santo dos Santos”. E esse era o menor lugar, e também o mais retirado. Ele expressava o caráter mais profundo da comunhão com Deus. Havia uma comunhão no altar de cobre ou na pia de cobre nos átrios – outra no lugar santo, à mesa, no castiçal e no altar – e outra na presença do próprio Senhor, no lugar santíssimo. E deste caráter de comunhão é aquela que os Cantares de Salomão expressa. Pode ser que a alma não consiga entrar nesse lugar todos os momentos. Rute não estava preparada para se colocar aos pés de Boaz quando entrou em seu campo como respigadora. O ensinamento que ela recebeu de Noemi foi necessário para levá-la à eira.

 

Avançar na intimidade 

E esse pequeno livro parece iniciar com a alma expressando tudo isso. Inicia com um forte e fervoroso desejo para com Ele mesmo; estendendo a mão para apreendê-Lo de uma maneira mais íntima do que havia sido entendido anteriormente. É como se o santo estivesse consciente de estar numa condição inferior à que agora satisfaria. Pois às vezes a alma repousa simplesmente no terreno firme das doutrinas; tais como “O sangue de Jesus Cristo, Seu Filho, nos purifica de todo pecado”. É o poder simples e seguro de tal verdade que por si só responde, às vezes, à necessidade da alma. Mas, novamente, às vezes, o terreno sob nossos pés, como crentes, é entendido e sobre ele descansamos, e é o próprio Senhor que a alma deseja. E tal é a sua condição aqui. “Beije-me Ele com os beijos da Sua boca”. Ela vinha cuidando das vinhas – cuidando das coisas no exterior, mas agora estava aprendendo que sua própria vinha havia sido negligenciada; e as coisas mais profundas da comunhão pessoal são almejadas. O santo está deixando o lugar de Marta e tomando o de Maria, desejando alimentar-se sob Seus próprios olhos e de Suas próprias mãos, e não pelas de outrem. E no final, a alma parece saber que se tornou guardiã da sua própria vinha. No início, houve a tristeza de que as vinhas de outros tivessem sido guardadas, mas a sua própria tivesse sido negligenciada (Cantares de Salomão 1:6); mas agora tem consciência de estar mais em casa, mais preocupada com a sua própria vinha; como se tivesse deixado o lugar de Marta, ocupada com muitas coisas, e assumido o lugar de Maria, aos pés de Jesus em comunhão pessoal (Ct 8:12).

 

Este é o avanço, o avanço consciente e feliz, que a alma faz através destes exercícios. Alcançou uma ordem superior de comunhão com o Senhor e deseja que isso continue até que Jesus volte.

 

O próprio estilo da escrita também é exatamente aquele que se adapta ao coração sob o poder de uma afeição dominante. “Beije-me Ele com os beijos da Sua boca” – como Maria Madalena ao suposto jardineiro – “Se tu O levaste” – ambas as passagens significando Cristo, mas nenhuma nomeando-O. Pois “o coração já estava absorvido com os pensamentos d’Ele, e para esse parente esses pensamentos eram aquele anterior – aquele bom assunto que o coração estava ditando. Pois aqueles que estão cheios de Cristo estão prontos a pensar que outros também deveriam estar assim”. Ou é como a linguagem do apóstolo, que se refere ao dia da glória e do reino sem nomeá-lo, quando diz: “eu sei em Quem tenho crido e estou certo de que é poderoso para guardar o meu depósito até àquele Dia”; e novamente: “Desde agora, a coroa da justiça me está guardada, a qual o Senhor, justo Juiz, me dará naquele Dia”.

 

Verdade e Amor estão unidos 

Assim é, no próprio estilo e maneira da mente renovada, olhando, como o faz, tanto para o próprio Senhor quanto para a glória. E abençoados são esses afetos. A verdade ou a doutrina do evangelho não é um sistema frio e rígido. Certamente nossa alma deve saber disso. Às vezes é estabelecido em proposições, assumindo a forma de um argumento, deduzindo conclusões de premissas adequadas e comprovadas. Mas ainda assim o evangelho exige as afeições mais calorosas e provê abundantemente para elas. Mesmo os próprios Cantares de Salomão nunca ultrapassa os limites estritos do evangelho. Nunca excede a medida que as regras mais estritas da verdade evangélica prescreveriam. Assim, para que possamos interpretar essas pequenas canções ou idílios à luz das Escrituras didáticas, como podemos ler proveitosamente essas Escrituras no fervor dos Cantares de Salomão. O apóstolo diz: “vos desposei com um só Esposo, para vos apresentar a Cristo como uma virgem pura” (TB). Isso pressupõe tudo o que está nos Cantares de Salomão. E desta forma, o evangelho, no seu sentido mais estrito, explicará tudo o que está nos Cantares de Salomão. Este último delineia as afeições que se adaptam bem às verdades e revelações que o primeiro ensina ou transmite. Mas sendo isso tão importante, a meu ver, desejo exemplificá-lo em alguns detalhes.

 

O Evangelho e o Cantares de Salomão 

Nestes idílios, o Senhor considera o santo totalmente amável. E assim é o crente aos Seus olhos. Sendo pecador em si mesmo, ele, pela fé, assumiu sobre si a beleza de Cristo. Ele está “n’Ele”. Ele tem “a justiça de Deus” sobre ele. Ele é “agradável [aceito – KJV] a Si mesmo no Amado”. Somente a fé lhe dá toda essa formosura. Ele foi batizado a Cristo e revestido de Cristo. Esta é a beleza do crente; e ele é agradável aos olhos de Cristo, como os Cantares de Salomão expressa repetidas vezes.

 

Na verdade, nesta forma de beleza não pode haver mancha. Pois é com o próprio Cristo que o crente está vestido. A “melhor roupa” da casa do Pai está sobre ele. É uma beleza imaculada em que ele brilha. A doutrina do evangelho nos ensina isso, e aqui Cristo expressa Seu deleite nela; tais harmonias existem entre os evangelhos e os Cantares de Salomão.

 

Mas, além disso, no mistério de Cristo e do crente, Cristo tem um “monte da mirra” para a qual Ele aqui convida o crente a dirigir seus passos – e Paulo nos exorta: “se já ressuscitastes com Cristo, buscai as coisas que são de cima, onde Cristo está assentado à destra de Deus” O crente sobe aqueles montes com Jesus, como aqui convidado e como no Evangelho exortado. Sua cidade (pátria – ARA) está no céu. Em Cristo ele está assentado nos lugares celestiais. E ele cheira a mirra e o incenso que ali estão.

 

Novamente, o Senhor Se deleita nas graças de Seu santo. Ele repousa, com o amor da complacência, no crente que anda no Espírito diante d’Ele (Jo 15:10). Ela é um jardim fechado sob Seu olhar, um manancial fechado, uma fonte selada. Conforme lemos, o Espírito está nele, uma fonte de água jorrando para a vida eterna. Ele tem o cheiro das especiarias e os fluxos da água viva em si mesmo, e a fragrância e o frescor destes alegram seu Senhor novamente. Este é o ensino do evangelho, e esta é a linguagem de Cristo nos Cantares de Salomão. Ele Se deleita com o que está em nós através do Espírito, bem como com o que está em nós através da fé. Ele tem Seu gozo nos lugares de comunhão com Seus eleitos aqui, como no céu ao qual Ele ascendeu.

 

Isso nos é amplamente dito na Escritura. “Ouve, filha, e olha, e inclina teus ouvidos; esquece-te do teu povo e da casa de teu pai. Então o Rei Se afeiçoará da [desejará a – TB] tua formosura, pois Ele é teu Senhor; adora-O” (Sl 45:10-11 – ACF). Aqui está algo além da beleza imputada. Pois aqui aprendemos a graça nela que acende Seu desejo. Ela esqueceu o seu próprio povo e a casa do seu pai, por isso o Rei a deseja. E ela O reconhece como Senhor e O adora. Ela Lhe prestará afeição e homenagem. E toda essa graça adequada e atraente foi demonstrada em Rebeca. Ela deixou tudo por Isaque. Ela esqueceu o seu próprio povo e a casa do seu pai, e atravessou um deserto desconhecido na companhia de um estranho, na singeleza e devoção de um coração não dividido. E ao chegar àquele por quem ela consentiu em tudo isso, ela lançou-se de seu animal e se cobre. Ela veste o ornamento de um espírito manso e tranquilo. Ela se reveste de timidez e sobriedade. Ela ama, e ainda assim se curva. E então Isaque a deseja. E assim deve a Igreja estar sujeita a Cristo, e ainda assim amá-Lo com amor virginal. Leia sobre isso em Efésios 5 e 2 Coríntios 11:2. (Afeição gera confiança. Rebeca se comprometeu com Eliezer, nunca pedindo escolta ao pai ou ao irmão. Portanto, quanto mais simplesmente amamos Jesus, mais confiantemente nossa alma confiará n’Ele e em Seus suprimentos somente para nós, sem confiança na carne ou qualquer coisa mais).

 

E nos Cantares de Salomão encontramos o Espírito de Cristo convidando Seu santo para a liberdade deste tempo presente, para a atmosfera de uma casa onde o brado de adoção é ouvido. Toda a era mais sombria e fria já passou. Toda aquela dispensação que mantinha a alma em escravidão e temor acabou. Ouve-se a voz da rola; a voz daquele perfeito amor que lança fora o temor. “Vão passando as trevas, e já a verdadeira luz alumia”, diz João, como se tivesse em mente os Cantares de Salomão. O santo deve agora levantar-se, assumindo o seu lugar como o amado e o belo, estando na plena consciência da pureza e da beleza pessoal, através da graça, e do perfeito favor e deleite do seu Senhor. Ele deveria se afastar do “espírito de temor” e passar para o espírito de amor e de poder “e de uma mente sã” (KJV). Pois tudo na dispensação alegra. As flores aparecem na terra e ouve-se o canto dos pássaros. Tudo é promessa, penhor, e selo, e unção.

 

E novamente, se a noiva dos Cantares de Salomão diz: “Enquanto o Rei está assentado à Sua mesa, dá o meu nardo o seu cheiro”, a discípula do evangelho faz isso (João 12:3).

 

E, de acordo com tudo isso, podemos observar como algumas das declarações mais ternas deste livro são garantidas pelas simples narrativas do evangelho. Se o amado zela pela alma restaurada com o mais carinhoso zelo, não permitindo que o passo ocupado de outros perturbe o descanso silencioso e oculto daquela amada, o que Jesus faz na casa favorecida de Betânia senão isso mesmo? Como Ele repreende os movimentos de Marta? Leia sobre isso em Cantares de Salomão 2:7 e Lucas 10:41 (“Até que ela queira”, deveria ser, já que “amor” é feminino neste livro. Cantares de Salomão 2:7; 3:5; 8:4).

 

Princípios morais 

Os grandes princípios morais da verdade também são entendidos aqui de forma estrita e completa, embora sob ilustrações muito delicadas e espirituais. Tiago diz: “Pedis e não recebeis, porque pedis mal, para o gastardes em vossos deleites”. Neste livro lemos: “De noite busquei em minha cama Aquele a Quem ama a minha alma; busquei-O e não O achei”. O grande princípio moral, de que existe uma busca que não encontra, é igualmente reconhecido em cada uma dessas Escrituras; mas um tem uma exposição muito mais delicada do que o outro. Jesus é aqui procurado na cama, isto é, com alguma desatenção mental. A cama pode ser o lugar de meditação (Salmo 63; Isaías 26), mas não de busca, que exige ação. E, portanto, aquele que está na cama, o desatento, apático e sonolento do Senhor, não O encontrará, até que passe pela disciplina, como temos aqui (Cantares de Salomão 3:1-5).

 

A satisfação de Cristo 

Se Cristo repetidamente expressa Sua profunda satisfação por ela, através deste livro, o que temos menos do que isso no ensino estrito da Escritura? Ele não descobriu, no início, que Suas “delícias” estavam “com os filhos dos homens”? E no final, quando Ele vir o trabalho de Sua alma por nós, Ele não ficará “satisfeito”? (Provérbios 8; Isaías 53). Se o pecador está contente com Ele, Ele também está igualmente contente com o pecador. A mulher junto ao poço, é verdade, esqueceu-se do seu pote de água por causa d’Ele; mas Ele esqueceu-Se de Sua sede por causa dela, e isso foi maior. E então, com igual regozijo de espírito, Ele disse, na mesma ocasião: “Uma comida tenho para comer, que vós não conheceis” (João 4).

 

Do primeiro ao último momento de nossa história Cristã, nosso poder de revigorar a mente de nosso Senhor é profunda e plenamente reconhecido na Escritura. Nossa primeira confiança n’Ele como pecadores O coloca imediatamente em uma festa (como acabamos de ver em João 4:32), para Se alegrar com Seus amigos (Lucas 15:9); pois os anjos se alegram. A recuperação de um errante é uma alegria para Ele. Leia a expressão da afeição divina sobre o arrependido Efraim, em Jeremias 31:20. E o que, aos olhos e ao coração de nosso Senhor, é o adequado andar dos santos e suas idas ao santuário? Não é “um espírito manso e quieto”, “precioso” aos olhos de Deus? Será que o comportamento puro do crente não O agrada, não transmite complacência ou deleite à mente divina? (1 Tessalonicenses 4:1). E como tal complacência em nós é testemunhada repetidas vezes pela promessa de que Ele Se manifestará a nós e fará morada conosco! (João 14).

 

Não confirma tudo isso as sugestões deste livro? E assim, tanto nos evangelhos como nos Cantares de Salomão, Cristo não é levado nos carros do Seu povo excelente (ou disposto – JND)? Onde, pergunto eu, o relato dos setenta O levou? (Lucas 10:17-18). Para onde o desejo dos gregos O transportou? (João 12:21-23). E a fé do soldado gentio poderia, por um momento, manter Seu espírito em deleite e admiração, e então levá-Lo adiante para a glória, quando o Oriente e o Ocidente enviarem para casa os filhos do reino com Abraão, Isaque e Jacó. (Veja Mateus 8:8-11).

 

Entristecido ou revigorado 

Mas a afeição que pode ser gratificada desta forma pode ficar ferida. Estas estão entre as propriedades do amor. Você pode entristecer e também revigorar o coração amoroso. E o mesmo acontece com nosso Senhor, tanto no Cantares de Salomão quanto nos evangelhos; como lemos também nas Epístolas: “Não entristeçais o Espírito Santo de Deus, no qual estais selados para o dia da redenção”.

 

E de novo. A noiva aqui sabe que os céus (simbolizados pelos outeiros e montes) receberam o seu Amado. Mas ela sabe também que, embora Ele esteja à vontade ali, como um gamo ou um filho do corço em seus montes nativos, ainda assim Ele Se deleita na comunhão com ela e a visita, olhando desejosamente através das grades. E ainda mais; ela sabe que seu dever é vigiar contra intrusões e perturbações, como os guardiões de uma vinha vigiariam contra as raposinhas. E eu pergunto: tudo isso não é a verdade, o prazer e a energia prática, repetidamente reconhecidos e reforçados no ensino do Evangelho? Sabemos que os céus receberam Jesus até “os tempos do refrigério”. Sabemos que Ele faz Sua morada atual com o santo e Se manifesta a ele, como não faz ao mundo. E sabemos que deve haver energia e vigilância para que “andemos no espírito” e não “na carne”, se quisermos provar e desfrutar dessas manifestações de Seu nome em nossa alma.

 

Trabalho árduo para produzir fruto 

Assim, ainda mais adiante, há um jardim, neste livro, sob o cultivo do vento norte e do vento sul, para que possa produzir seus frutos e especiarias ao Senhor. E o estilo mais simples do Novo Testamento não admite totalmente a ideia? O próprio Pai é o Lavrador de uma videira que Ele cava e esterca; e o santo é como um campo que absorve a chuva do céu, para produzir ervas adequadas para Aquele por Quem é cultivado. (Veja João 15; Hebreus 6).

 

Na figura aqui temos Cristo como um pretendente à porta, pedindo àquela que Ele ama a Sua admissão “das gotas da noite”; e no Novo Testamento nós O temos de pé e batendo no coração relutante, desejando aquela recepção que uma afeição reavivada e zelosa certamente Lhe proporcionaria (Apocalipse 3:20). E será bom para nós, amados, se nosso morno laodiceanismo apenas se afastar, como a sonolência desta querida, neste encantador cântico místico (Ct 5:2-16).

 

O santo conscientemente amado

E não sei se a constante autocongratulação da noiva neste livro está um pouco além da de Paulo. Ela sempre pode falar que seu Amado é dela e, além disso, dizer: “Eu sou do meu Amado, e Ele me tem afeição”. Mas ele também pode sempre, em espírito, cantar (seja qual for o trabalho árduo e o desgaste da vida): “a vida que agora vivo na carne vivo-a na fé do Filho de Deus, o Qual me amou e Se entregou a Si mesmo por mim”. E essa é a linguagem de Paulo, feliz na certeza do amor devotado de Cristo por ele. (É comumente interpretado como se Paulo, em Gálatas 2:20, estivesse expressando sua devoção ao seu Mestre. Mas não é assim. Isso rouba ao versículo sua extraordinária glória. Ele está antes falando do regozijo de sua alma no conhecimento de que Amante devotado e glorioso ele tinha).

 

Se, posso também dizer, nas imagens deste livro, o santo amado pode dizer: “desejo muito a Sua sombra e debaixo dela me assento; e o Seu fruto é doce ao meu paladar”, o estilo mais simples de uma epístola não é menos fervoroso. “Ao Qual, não o havendo visto, amais; no Qual, não O vendo agora, mas crendo, vos alegrais com gozo inefável e glorioso”. Certamente o coração está igualmente na possessão de um Objeto que ele sabe ser adequado para responder a todos os seus desejos.

 

Terno com o crescimento 

E ainda mais. Temos, nas ações deste livro, almas em diferentes elevações, a noiva e “as filhas de Jerusalém”. Quanto isso é conhecido entre elas e contemplado nas ilustrações e ensinamentos do Novo Testamento! Nem todos estão totalmente formados – nem totalmente na medida da estatura, por assim dizer. “Temos uma irmã pequena, que ainda não tem peitos”. Nem todos são iguais na liberdade da dispensação. Tais pessoas atraem a empatia do santo estabelecido na graça de Deus, e cuidado solícito, oração e indagação ao Senhor são feitos a respeito de tais pessoas, como aqui (Veja Cantares de Salomão 8:8).

 

Na verdade, não sei se algo pode estar mais nas harmonias do Espírito, nas luzes combinadas e brilhantes do evangelho, do que a expressão da noiva nesta pequena passagem (Cantares de Salomão 8:8-10). As ações de sua alma, tanto para com os outros como para com o Senhor, são as obras mais doces e escolhidas do Espírito. Ela tem respeito pelas “fraquezas dos fracos”, desejando para eles força e edificação na medida mais completa de Cristo, e ainda assim, o tempo todo reconhecendo plena unidade e relacionamento com eles n’Ele, enquanto ela se regozija em sua própria segurança certa e feliz, e na plenitude do seu crescimento, até ao êxtase, que os seus seios eram como torres! E por causa disso, conhecendo o favor de seu Senhor para com ela, e Seu deleite nela. E podemos ter certeza de que tudo isso é pura e ricamente o caminho de uma alma renovada e crente. Adoção plena dos fracos, com desejos de maior liberdade e segurança, e ainda assim certeza de posição pessoal no mais absoluto gozo da inteira segurança, com perfeita persuasão de que toda essa liberdade e confiança estavam profundamente no coração e na mente de Jesus.

 

Nada pode ser mais perfeito, creio eu, do que tudo isso nas harmonias e luzes de uma mente espiritual, de acordo com o sentido mais estrito da verdade evangélica.

 

Renovado por um amor despertado 

Assim, repetidamente, na história do evangelho, encontramos Jesus sendo levado a esquecer Suas tristezas ao contemplar a fé em um pecador. Ele encontrou ali, como já afirmei, o refrigério do Seu espírito. Ele encontrou um esquecimento transitório de Suas tristezas entre os samaritanos, do centurião, de Zaqueu e do nardo e da comunhão de Maria. Ele busca o mesmo aqui. Ele vem até Sua noiva, para que possa encontrar, em comunhão com ela, alguma outra coisa muito diferente daquela rejeição e recusa que Ele sempre encontrava no mundo. E não é também assim que, se o santo for preguiçoso e descuidado, os fiéis parentes de Cristo ajudarão na disciplina? Se Jesus disser: “Nem uma hora pudestes vigiar Comigo?” Paulo dirá: “portai-vos varonilmente e fortalecei-vos”. Assim, na ação deste livro. Jesus deixa um memorial da sonolência da alma na “fresta da porta”, para que a consciência possa se alarmar; e os guardas da cidade a espanque, e os guardas dos muros tirem o véu de seu rosto (Cantares de Salomão 5).

 

As harmonias do “um Espírito” são ouvidas em tudo isso. E assim, no decorrer desses pequenos cânticos, posso ver o caminho do Senhor em direção a uma alma arrependida e recuperada (Veja Cantares de Salomão 6:4-13). Ela simplesmente se recusou a abrir sua porta para Ele, mas, através da disciplina, foi levada novamente a uma comunhão fervorosa com Ele (Cantares de Salomão 5:2-6:3). E agora Seus olhos e Seu coração estão cheios dela novamente. Ele olha pra ela e a vê tão bela como sempre. Ela é Sua “imaculada” e nada menos; nenhuma censura passa por Seus lábios. A movimentação dela em direção a Ele é bela e graciosa em Sua estima. E Ele a fez saber que o arrependimento dela Lhe proporcionou um agradável e maravilhoso refrigério. Assim que ela se dispôs (Salmo 110:2), Ele subiu em um carro para levá-Lo rapidamente e com alegria até ela (Cantares de Salomão 6:12). Ela pode estar surpresa consigo mesma, pode tomar um lugar indigno de qualquer atenção (v. 13); mas o Senhor Se alegra com ela, e os anjos também. Como sabemos nos evangelhos, os noventa e nove justos podem ser deixados por causa de um pródigo; os anjos no céu se alegram; a casa se regozija; os amigos do amado triunfam sobre a Sulamita que retornou. Ela é como o Jacó que retornou: os Maanaim, as hostes de Deus, saúdam a ambos, esperam no limiar da terra ou da casa, para fazer a vontade de seu Senhor para com eles e expressar Suas boas-vindas e preocupação por eles. Leia sobre isso em Gênesis 32:1 e Cantares de Salomão 6:13. (Alguém me fez uma observação que, nos Cantares de Salomão, o Amado expressa diretamente para ela mesma as belezas que Ele discerne nela; a noiva nunca faz isso, mas recita Suas belezas aos ouvidos dos outros; e observou ainda que havia grande propriedade moral nisso, algo muito de acordo com os ditames de uma atenciosa afeição).

 

Ansiando pela plena comunhão 

E que é que se anseia aqui senão que o dia amanheça? E qual é o anseio da mesma alma nas palavras do Evangelho? “Ora, vem, Senhor Jesus” – de forma tão ampla e exata os ensinamentos e as respirações do Novo Testamento, nessas e em outras maneiras semelhantes, medem as afeições do coração neste livro. Cristo habita no coração pela fé. Cristo repousa a noite toda entre os seios (Veja Efésios 3:17; Cantares de Salomão 1:13). E será que o santo não tem sintonizado seu coração com Jesus numa linguagem de igual fervor, tal como todos nós usamos sem nos envergonhar?

 

“Quão tediosas e insípidas são as horas

Quando Jesus não vejo mais,

Doces perspectivas, doces pássaros e doces flores,

Perderam toda a sua doçura para mim.

 

O Sol do meio do verão brilha, mas é fraco,

Os campos se esforçam em vão para parecerem vistosos,

Mas quando estou feliz n’Ele,

Julho é tão agradável quanto setembro.

 

Seu nome produz o perfume mais rico,

 E mais doce que a música é Sua voz,

 Sua presença dispersa minha tristeza,

 E faz tudo dentro de mim se alegrar.

 

Eu deveria, se Ele estivesse sempre tão perto,

Não ter nada a desejar ou a temer,

Nenhum mortal é tão feliz quanto eu,

Meu verão duraria o ano inteiro.”

  

Outras semelhanças com o Novo Testamento 

Estes estão entre os selos colocados nesta bela porção da Palavra de Deus pela mente espiritual do crente, e também por verdades e princípios semelhantes encontrados em outras Escrituras. E foi dito apropriadamente que “se não há alusão expressa a este livro no Novo Testamento, a mesma alegoria, como retratando a mesma verdade, evidentemente parece ter sido familiar às mentes dos seus escritores, e para as mentes também das pessoas a quem se dirigiam. Não mais abruptamente João Batista, por exemplo, se refere a nosso Senhor como ‘o Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo’, como sendo o caráter do Messias que todos conheceriam e entenderiam, do que ele se refere à mesma Pessoa abençoada no caráter do Noivo da Igreja – ‘Aquele que tem a Noiva é o Noivo’”.

 

Tempo de preparação 

E não é oportuno, nestes dias de crescente irreligiosidade e mundanismo, alertarmos uns aos outros, amados, para mantermos nossas mentes incorruptas na simplicidade que há em Cristo? Na época de preparação, que é a era atual, e que os Cantares de Salomão contemplam, Eva estava se preparando, sob a mão formadora de Deus, para Adão, e somente para Adão. Adão dormiu para Eva e Eva foi feita para Adão. O mesmo acontece com Cristo e a Igreja. Ele dormiu na morte por nós, e estamos sendo preparados, sob o Espírito Santo, para Ele. “Vos desposei com um só Esposo, Cristo, para vos apresentar a Ele como virgem pura” (AIBB). Como ele diz também em outro lugar: “Meus filhinhos, por quem de novo sinto as dores de parto, até que Cristo seja formado em vós”, Cristo, e somente Cristo, Cristo em Sua preciosa suficiência por um pecador, em resposta ao pensamento sobre Agar ou os gálatas, em relação a “dias, e meses, e tempos, e anos”, aquele outro evangelho que, no entanto, não é outro.

 

Mas isso é atacado. O evangelho, em sua reivindicação ao pecador de dar sua confiança total em Cristo, tem estado espalhado pelos lábios de milhares de testemunhas, para alegria de milhares de almas. O inimigo assistiu e odiou isso. Trabalhando na cena em que ele vai “para lá e para cá” e “para cima e para baixo” (Jó 1:7 – JND), ele está ocupado em seduzir o coração para longe deste evangelho. E o seu sucesso não está muito além do que qualquer um de nós poderia temer? A religião das confianças carnais ou das ordenanças está até agora entre nós. Admite o mundanismo; e o mundanismo está, neste mesmo momento, florescendo em sua companhia. Há a construção de templos para adoração e de palácios para os adoradores; cuidado mais rigoroso para observar, em seu tempo, a devida frequência ao santuário, juntamente com habilidade, energia e iniciativa incomparáveis no avanço da indulgência e elegância da vida humana, de modo a tornar o mundo um lugar desejável e seguro para se viver – um lugar onde a religião pode agora ser vista como observada e honrada.

 

Tudo isso é sedutor e afasta o princípio da fé – isso é corrupção da mente ao afastar-se da simplicidade que há em Cristo. O evangelho se dirige ao homem, não apenas como culpado, mas como uma criatura religiosa. Encontra-o sob o poder da superstição ou da religiosidade, bem como do pecado. É tão natural que o homem se recuse a entrar na sala de julgamento por medo de ser contaminado, como é, em grande inimizade com Deus, clamar: “Crucifica-O, crucifica-O”. E o evangelho recebe uma recusa tão severa por parte do homem religioso quanto do homem lascivo. Como nos diz o Divino Mestre, a prostituta entra no reino adiante do fariseu.

 

Valorizando Sua Bênção 

As vaidades religiosas estão desempenhando profundamente o seu papel em nossos dias e fascinando muitas almas. Que resposta, amado, você e eu damos a elas? Jesus é tão precioso que nenhum atrativo tem poder? A pureza virginal da mente ainda é mantida? E, como pessoas castas, ainda estamos noivos apenas com Cristo? Como a Eva recém-formada, estamos nós em nosso lugar de apresentação mais antigo e fresco ao nosso Senhor? Ou será que nós, apartados de Seu lado, abrimos nossos ouvidos para a serpente?

 

O reino dos céus é como uma ceia, uma festa real e alegre preparada para os pecadores, para que possam provar e ver que o Senhor é bom e que é bem-aventurado o homem que n’Ele confia. Não coloca Deus no lugar de um Recebedor, esperando que o homem Lhe dê o que Lhe é devido; mas coloca-O no lugar de um Doador, e o homem é chamado a valorizar a Sua bênção. Mas a questão é: quem ouve, com coração desejoso, o convite? Quem usa “a veste nupcial”? Quem valoriza Cristo? Quem triunfa em Sua salvação? Quem anseia pelo dia de Seu casamento?

 

João estava com esta vestimenta, sabendo, como ele sabia, o gozo de ser amigo do Noivo. Ela fluía livremente sobre os ombros de Maria, enquanto ela se assentava aos pés de seu Senhor e ouvia Suas palavras. Paulo a ajustou firmemente sobre si quando disse: “Longe esteja de mim gloriar-me, a não ser na cruz de nosso Senhor Jesus Cristo”. O eunuco tinha acabado de vesti-la enquanto “jubiloso, continuou o seu caminho” com fé no nome de Jesus. Todo pecador se adorna com ela no momento em que seu coração valoriza Cristo. E que gozo é saber assim que quando nos vestimos de Cristo não estamos colocando “saco” sobre nós, nem é “espírito angustiado” em que entramos, mas “uma veste nupcial” nos vestiu, e com uma “veste de louvor” adornamos nosso espírito!

 

Temos aprendido “o reino dos céus” dessa forma? Será que entramos nele, em espírito, como um salão de banquetes onde tanto a magnificência como o regozijo nos recebem? Estamos conscientes de que somos convidados do casamento do Filho de um Rei? Aprendemos os mistérios da fé? Temos contemplado a eles? A reflexão sobre eles acendeu um fogo no coração para queimar a palha dos rudimentos mundanos? Paulo tinha esse elemento em sua alma enquanto viajava pela Grécia. E como o brilho desses mistérios se dirigiu aos “príncipes do mundo” ali? Isso consumiu todos eles. “Onde está o sábio? Onde está o escriba? Onde está o inquiridor deste século?” Precioso ardor do Espírito! Que pilha foi disparada dessa maneira nas famosas cidades dos escribas e dos sábios! E como todos os pensamentos dos homens foram jogados nele como lixo!

 

E como ele tratou os rudimentos do mundo religioso? Ele levou consigo o mesmo sentimento fervoroso de Cristo em suas regiões, para testar que palha e escória havia ali. Na Galácia ele encontrou muito disso; mas ele não poupou nenhuma delas. Ainda que um anjo do céu junte tal lixo; ainda que o próprio Pedro ajude no trabalho; ainda que os gálatas, que antes teriam arrancado os olhos por ele, sejam seduzidos, nada deveria resistir ao calor do Espírito que o levou adiante. “Ó insensatos gálatas, quem vos fascinou?... guardais dias, e meses, e tempos, e anos. Receio de vós”.

 

Ele poderia fazer menos? Poderia ele carregar Jesus em seu coração e permanecer calmamente e medir sua luz com as luzes da Grécia, ou a grande ordenança de Deus com as tradições do homem?

 

O que queremos é dar muito valor a Cristo – muito a Si mesmo e a Suas gloriosas realizações pelos pecadores. Queremos simplicidade nesse sentido da palavra – a respiração de uma alma satisfeita com Ele e a paz de uma consciência para sempre descansada em Sua suficiência. “Que pensais vós do Cristo?” é a prova, como diz um hino querido e conhecido entre nós:

 

“Alguns O chamam de Salvador, em palavras,

 Mas misturam suas próprias obras com Seu plano,

 E esperam que Ele conceda Sua ajuda,

 Quando tiverem feito tudo o que puderem.

 Se o fazer se mostra muito leve

 (Um pouco eles reconhecem, eles podem falhar),

 Eles pretendem compensar o peso total

 Lançando Seu nome na balança.

  

“Alguns O consideram a pérola de grande valor,

 E dizem que Ele é a fonte das alegrias,

 No entanto, alimentam-se da loucura e do vício,

 E apegam-se ao mundo e aos seus brinquedos –

 Como Judas, o Salvador eles beijam,

 E, enquanto eles O saúdam, O traem –

 Ah, de que valor será uma profissão assim;

 O que aproveitará em Seu dia terrível!

 

“Se me perguntarem o que penso de Jesus,

 Embora todos os meus melhores pensamentos sejam apenas pobres,

 Eu digo, Ele é minha comida e minha bebida,

 Minha vida, e minha força, e meu tesouro;

 Meu Pastor, meu Marido, meu Amigo,

 Meu Salvador do pecado e da escravidão,

 Minha esperança do começo ao fim,

 Minha porção, meu Senhor, e meu tudo.”

  

Um objeto suficiente 

Que esses sejam nossos pensamentos e afeições. Eles são o doce testemunho da uma só fé, do um só Senhor, do um só Espírito (Efésios 4), pois expressam a mente que dirige e governa os Cantares de Salomão. Ali, a alma com afeição semelhante tem apenas um objeto, mas esse é o suficiente. Está satisfeita e nunca por um momento sequer procura por um segundo objeto. Tem o “Amado” e não se importa com mais nada. Se isso entristece, é por falta de capacidade de desfrutá-Lo. Não busca nada além de Jesus, lamentando apenas que não esteja mais plena e completamente com Ele. E esta é a experiência que devemos desejar: encontrar no Senhor um Objeto que satisfaz, uma cura para as andanças do pobre coração, que, até que se fixe n’Ele, continuará perambulando e ainda dizendo: “Quem nos mostrará o bem?”. “O trabalho dos tolos a cada um deles fatiga, pois não sabem como ir à cidade”.

 

“Essa insatisfação com os desfrutes transitórios de que os homens se queixam como a infelicidade de sua natureza é de fato um privilégio deles”. De fato, esse é um sentimento justo e verdadeiramente apreciado. Por esse ganho sedento, por esse gasto de “trabalho naquilo que não pode satisfazer”, lança o coração em Jesus. Como isso sempre foi também é agora. A construção de palácios, a plantação de vinhas, a obtenção de cantores e cantoras, a multiplicação das delícias dos filhos dos homens, todos esses esforços e dores de parto do coração seguem seu curso e ainda seguem seu caminho (Eclesiastes 2). Mas Jesus revelado ao coração, como neste livro, ordena que esses pensamentos e propósitos sejam afastados. Ele fala a linguagem do próprio bendito Senhor; e a experiência nele contida é a experiência da pobre mulher que conseguiu deixar seu cântaro no poço: “Qualquer que beber desta água tornará a ter sede, mas aquele que beber da água que Eu lhe der nunca terá sede, porque a água que Eu lhe der se fará nele uma fonte de água a jorrar para a vida eterna”.

 

“Eu Sou a Raiz e a Geração de Davi, a resplandecente Estrela da manhã... Ora, vem, Senhor Jesus” (Ap 22:16, 20).

 J. G. Bellett

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